Tens ódio no teu de dentro, anão? Claro, não sou feito de açucenas, tu sabes que me enrabam por aí, que é treva esse sulco que faço sobre a terra, que existo porque, sabes que não sei bem por que existo? Nem eu, anão.Estamos conversando há muito tempo e quase nada do que falas eu entendo. Nem eu, Ruiska. AIURGUR é bonito porque tem ronco e ais, AIURGUR é muito dor, tu não achas?
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Sinergia e Hyperballad, ensaiando a morte.
Em Hyperballad, Björk fala de um eu lírico que toda manhã caminha até a beira de um penhasco e atira pequenos objetos abaixo enquanto imagina como o seu próprio corpo se comportaria fazendo a mesma trajetória; imagina que barulhos o próprio corpo faria colidindo com as pedras e cogita se, quando chegasse ao fundo, seus olhos estariam abertos ou fechados. Segundo o eu lírico, esse ritual matutino permitiria que houvesse uma melhor apreciação da segurança que sentiria mais tarde ao lado de um interlocutor.
Há um eu que é agora capaz de descompreender a si e dissolver em granizo e em lama essa instância cujos limites foram rígidos e cruciais.
Em Sinergia, a tentativa era de explorar exatamente o sentimento catártico de imaginar uma morte possível, mas dum ponto de vista mais expressamente interessado. Em Hyperballad, o eu lírico omite que circunstâncias o levam a agir de tal maneira, mas em Sinergia o intuito era justamente o de exacerbar a sensação de uma sobrecarga sensorial que o mundo, sem nenhum intuito explícito, exerce no eu lírico. Nesse sentido, o eu lírico passa a entender a sua própria existência enquanto contribuinte díspar para a cacofonia de sinais e a morte como um realinhamento com a pureza cruel da natureza, como o fim do limite entre o que é e o mundo. Há um contraste e aproximação do mundo natural com as intervenções humanas, e como essas tentam dissociar o homem do mundo, mas ao mesmo tempo falham em atenuar, postergar ou impedir o reencontro com a natureza na morte. Contudo, embora haja tanto peso e gravidade na perspectiva do eu lírico, o final do texto revela que o mundo natural é indiferente à cisão homem X natureza e, finalmente, não há uma reintegração possível, já que a ruptura é apenas uma abstração humana. As ondas retornam ao atlântico, e o leitor a sua realidade, talvez, com a sensação de que sentir-se como pertencente ao mundo e enxergar-se como parte de um todo não implica a sua morte. Como se tivesse também participado do ritual matutino.
Sinergia é um texto meu publicado na folha volante de poesia GAROA, parte do Jornal Jamburana Literária, idealizado por Daniel Prestes.
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